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O ‘custo inferno’ da Guerra Santa da OTAN

Uma coisa, para Teerã, é aceitar euros em pagamento pelo óleo e gás iranianos; outra coisa é aceitar ouro

Pepe Escobar

A secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton está ficando sem munição retórica na Guerra Santa dos EUA contra a Síria. Talvez seja o estresse de declarar uma guerra da OTAN, pelas costas do Conselho de Segurança da ONU. Talvez, o estresse de ser almoçada e jantada, todos os dias, pelo ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov.

Hillary acaba de convocar “as potências ocidentais” e seus fantoches árabes – o CCGOTAN, aglomerado de Conselho de Cooperação do Golfo plus Organização do Tratado do Atlântico Norte, que ela apresenta como se fosse alguma “comunidade internacional” – para que “deixem claro que Rússia e China pagarão, por impedir o progresso” (da mudança armada de regime na Síria).

Em não-novilíngua, significa: “Se impedirem nossa nova guerra, haverá retaliação.”

Não obstante as gargalhadas ouvidas pelos corredores do Kremlin e do Zhongnanhai, a coisa mostra o quão desesperado está o conglomerado CCGOTAN para forçar a mudança de regime na Síria, a ser usado como meio para interromper a conexão privilegiada que liga o Irã ao mundo árabe. Isso tudo, enquanto o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan da Turquia – no comando do flanco oriental da OTAN – comicha de vontade de atacar a Síria, mas não encontra jeito de vender a ideia à opinião pública turca.

Nesse contexto incandescente, aparece WikiLeaks – que divulgou grande quantidade de mensagens de e-mail contra, simultaneamente, o sistema de Assad e os ‘rebeldes’ da OTAN. Um dos efeitos colaterais possíveis, os e-mails talvez inspirem ondas de chamados ‘progressistas’ em todo mundo, que se porão a defender a Guerra Santa contra a Síria. Efeito mais realista, talvez evidenciem o quanto, de fato, os dois lados são horríveis: tanto o estado policial de Assad quanto a oposição armada.

Explosão de carro de turismo: alguém se interessa?
Útil, nesse momento, é examinar o preço que a própria Washington, para nem falar nos seus estados fantoches na OTAN, está pagando por tanto insistir esse neo-ramo de guerra santa guerreada contra – nada mais, nada menos – que o mesmo bando de “terroristas” que, até ontem, ameaçavam destruir a civilização ocidental, convertendo-a num Califato tamanho gigante.

Washington, Londres e Paris tentaram – duas vezes – arrancar do Conselho de Segurança da ONU a ‘licença’ para mais uma guerra. Foram bloqueadas pela Rússia e pela China. O plano B, então, é esquecer a ONU e deflagrar guerra da OTAN. O problema é que a OTAN não tem estômago – nem dinheiro – para meter-se em guerra de alto risco contra país capaz de se defender.

Plano C: se nem A nem B, o plano C é apostar tudo numa longa guerra civil, usando para tal fim o Exército Sírio (nada) Livre, que pulula de mercenários e jihadis, e o bando exilados oportunistas que atende pela sigla de Conselho Nacional Sírio (CNS).

O CNS já pediu uma zona aérea de exclusão ao estilo líbio, sobre a Síria – expressão que é sinônima de “guerra da OTAN”. A Turquia também requisitou formalmente à OTAN a dita zona aérea de exclusão. Os comandantes da OTAN são incompetentes, mas até eles aprenderam alguma coisa com as grandes enrascadas em que se meteram e o correspondente embaraço que lhes causam (no Afeganistão, por exemplo). Responderam “não” aos pedidos do CNS e da Turquia.

Nada menos representativo que o Conselho Nacional Sírio e o Exército Sírio (nada) Livre. Os “Amigos da Síria” – “Hillary & seus Patetas” – nem tomam conhecimento da existência do Corpo Nacional de Coordenação para Mudança Democrática [orig. National Coordination Body for Democratic Change (NCB)], principal movimento de oposição verdadeira, composto de 13 partidos políticos, a maioria dos quais da esquerda, nacionalistas árabes e um partido curdo. Esse NBC denuncia insistente e firmemente todas as formas de militarização do conflito e desautoriza absoluta e radicalmente o Exército Sírio (nada) Livre.

O ministro de Relações Exteriores do Iraque, Hoshyar Zebari – que é curdo – alertou que jihadis salafistas de molde copiado da al-Qaeda estão-se mudando aos magotes para a Síria. Aparentemente, esses magotes ainda ouvem muito atentamente o que prega o ideólogo “invisível” da al-Qaeda, Dr. Ayman al-Zawahiri. Há cinco meses, al-Zawahiri deu ordem de marcha aos jihadis no Iraque, Jordânia, Líbano e Turquia. E acontece também que muitos deles estão recebendo armas – por diferentes redes – da Casa de Saud e do Qatar.

Já há meses, todos sabem que o Grupo de Combate Islâmico Líbio [orig. Libyan Islamic Fighting Group (LIFG)] de Abdul Hakim Belhaj, ligado à al-Qaeda, está ativo na Síria; como todos também sabem que há remanescentes da al-Qaeda no Iraque, responsáveis por explosões de carros até em Damasco.

No caso de uma Síria pós-Assad dominada por sunitas linha-dura infiltrados por jihadis wahhabitas e salafistas, a retaliação garantida fará a jihad antissoviética no Afeganistão pós-80s parecer Disneylândia em Hong Kong.

Aceitam-se yuan e rublos

Quanto à China, ri do desespero de Hillary no caminho até o banco. Enquanto cresce a paranóia na Casa de Saud contra o que os sauditas veem como flerte de Obama com a democracia no mundo árabe, Pequim aquece as turbinas comerciais e entrega a Riad um buquê de novos mísseis.

E, enquanto o “ocidente” flerta com a Guerra Santa, as empresas estatais chinesas compram mercadorias feito doidas, por todo o Oriente Médio, Norte da Áfria e América do Sul – além de ampliar seus estoques de terras raras nas reservas estratégicas. A China produz nada menos que 97% das terras raras do planeta – necessárias para tudo, de iPads àqueles novos mísseis que lá fritam hoje, sob o sol do deserto da Arábia.

Outros efeitos colaterais em matéria de “o preço a pagar” por atropelar a ONU e pela obsessão com a OTAN como Robocop global serão inevitáveis para os EUA. Não se deve esquecer que a Guerra Santa contra a Síria é pit stop na estrada para Teerã. Por exemplo: pode estar nascendo um novo sistema de seguro marítimo, além de um novo mecanismo de câmbio internacional – que ignorará o diktat do ocidente.

Mesmo assim, o elemento mais importante parece ser o movimento, de Rússia, Irã e China, para reorganizar o mercado global de energia, via transações que marginalizam o petrodólar.

Quer dizer: Washington corta o Irã do sistema SWIFT (Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication)? O banco central iraniano contra-ataca: se vocês quiserem negociar conosco, podem pagar em qualquer moeda, exceto o dólar norte-americano; também aceitamos ouro.

Esse é o Santo Graal da Guerra Santa – não a Síria. Uma coisa, para Teerã, é aceitar euros em pagamento pelo óleo e gás iranianos; outra coisa é aceitar ouro. E, como se não bastasse, com pleno apoio de Rússia e China.

Em resumo: toda a síndrome da Guerra Santa está apressando o fim do dólar norte-americano como moeda global de reserva. E então? Agora, acontecerá o quê? Uma Primavera Norte-americana? Ou as elites dos EUA terão – feito a Máfia – colhões e musculatura para forçar Rússia e China a pagarem o preço?

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