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O valor de uma medalha: como economia e geopolítica influenciam na Olimpíada

Por Pedro Chadarevian - Opera Mundi
 
Fatores não esportivos tem impacto direto, mas não decisivo no desempenho das nações
Agência Efe

A ginasta Lilin Deng, medalha de ouro na trave, faz parte de uma geração que viu a China se transformar em superpotência olímpica e econômica

A consolidação da China, ao lado dos EUA, no topo do quadro de medalhas em mais uma Olimpíada confirma a importância histórica do esporte nas disputas pelo controle da hegemonia regional e mundial entre os países. De fato, uma rápida análise do ranking das nações mais bem classificadas nos últimos jogos mostra uma correspondência com a ascensão econômica e política recente dos novos atores globais.

A poucos dias do encerramento das Olimpíadas de Londres, o quadro provisório de medalhas indica um desempenho bastante estável dos países centrais. Na realidade, raros são os países periféricos que conseguiram, entre Atlanta-1996 e Pequim-2008, quebrar a dominação das grandes potências e alcançar as quinze primeiras colocações. As exceções são, de um lado, os países do antigo bloco comunista (a Hungria, e a nova potência energética da Ásia Central, o Cazaquistão, que consolida sua ascensão em 2012) e aqueles que ainda preservam um regime socialista, como Cuba e Coréia do Norte; e, de outro lado, fenômenos em esportes localizados – no caso, o atletismo - como Quênia e Jamaica.

Os fatores que determinam o ranqueamento dos países no quadro de medalhas, não são, portanto, tão óbvios assim, e têm intrigado economistas em busca de um modelo que explique o fenômeno. O Financial Times realizou em seu site (leia aqui - inscrição gratuita) uma previsão da quantidade total de medalhas em Londres-2012, utilizando os parâmetros dos principais modelos disponíveis, cujas variáveis vão desde o PIB per capita, passando pela população, até o desempenho médio em Olimpíadas dos países.

Agência Efe
O persa Omid Haji Noroozi, ouro na luta greco-romana: Irã é subestimado tanto esportivamente quanto como potência emergente

O resultado obtido é bastante próximo à realidade, apesar da margem de erro muitas vezes elevada, levando a uma subestimação do total de medalhas japonesas, iranianas, húngaras e colombianas, cujos desempenhos estão realmente muito acima de sua média histórica. Os modelos também superestimaram, visivelmente, o potencial de Cuba, Bulgária e Ucrânia, antigos centros de excelência esportiva socialista, agora em plena decadência.

No esporte, como na economia, a capacidade de previsão dos economistas convencionais tem, no entanto, deixado muito a desejar. Isto se deve, segundo os críticos da matematização e da modelagem na ciência econômica, ao fato que a complexidade da ação humana e dos fenômenos sociais não pode ser reduzida a um número finito de parâmetros e variáveis contidos em uma equação. A superação dos esportistas em uma competição está evidentemente relacionada com o potencial econômico de seu país.

Porém, como quantificar por exemplo variáveis determinantes de seu desempenho como o sentimento nacional (que parece contaminar como nunca antes os atletas do Reino Unido agora), ou a pressão exercida por lideranças políticas instáveis, que sabem do potencial legitimador dos investimentos no esporte (a ditadura cazaque, em primeiro lugar)?

Portanto, se é verdade que o desempenho das nações nas Olimpíadas guarda uma relação com fatores econômicos e demográficos, outros, de natureza principalmente geopolítica, não podem ser diretamente estimados em modelos matemáticos ou econométricos. Pesa certamente para isso, o esforço para se obter reconhecimento local e regional e, alguns casos, global, como nos casos dos países que têm assistido uma rápida ascensão e ameaçam a hegemonia esportiva estabelecida no quadro de medalhas.

Dentre eles, os casos mais emblemáticos dos últimos jogos são o Irã (43º colocado em Atlanta-1996, com uma medalha de ouro, e que deve ficar no top 15 no ranking de Londres-2012); a Coréia do Sul (que desde 1996 se posiciona entre os 15 melhores, mas que pela primeira vez briga para estar entre os cinco em 2012); e, definitivamente superpotência, a China (“apenas” 11.ª em Seul-1988 e entre os três melhores desde Sidney-2000).

Agência Efe
Os próximos jogos no Rio em 2016 poderão, a se manter esta tendência, ser a oportunidade de confirmação da liderança regional que o Brasil pretende exercer no subcontinente latino-americano.
Uma liderança econômica e geopolítica que tem enfrentado resistências localizadas, tanto internas, quanto externas, mas que contará com o poder legitimador de um evento esportivo global e com o prestígio praticamente unânime que ele exerce sobre a população.

Resta saber se os investimentos programados pelo Estado nas diferentes categorias esportivas se materializam a tempo. Ou se, como em outras áreas do governo, a pressão dos interesses conservadores terá também neste caso força para abortar os gastos públicos fundamentais para o salto estratégico que o país gostaria de dar.
Pois, se é verdade que as medalhas trazem um retorno político incomensurável e garantido, elas também cobram da sociedade um custo elevado, considerado, porém, excessivo pela mentalidade atrasada, e ainda dominante, das elites que comandam o país.

(Foto acima: a goleira Shana, da equipe brasileira de handebol chora após ser eliminada pela Noruega, campeão olímpica de 2008; após uma série de investimentos a longo prazo, a modalidade saiu de um estágio amador para se confrontar de igual para igual com as potências europeias)

Pedro Chadarevian é doutor em Economia pela Universidade de Paris, professor de Economia na Universidade Federal de São Carlos e editor do blog Outra Economia. Escreve quinzenalmente ao Opera Mundi.

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