Por Genaldo de Melo

Apesar de respeitar as vozes dissonantes às
minhas em relação ao tamanho do Estado em suas plenas funções no processo de
organização das sociedades modernas, discordo veementemente de seus apelos para
o seu pleno desmonte, com as premissas de que parcela da humanidade deve ficar
livre e solta para fazer do ponto de vista econômico o que quiser, sem
obrigações elementares com o resto da sociedade, que deve servir apenas como
força de trabalho e mão-de-obra barata. Se assim for, criaremos em breve
sociedades de escravos em que a força será utilizada não por exércitos nacionais
ou polícias, mas por milícias particulares de quem não quer ser partícipe do
grande pacto em torno dos Estados para a própria convivência humana.
Não posso jamais ser totalmente contra a
livre iniciativa como ela existe até hoje, até mesmo porque como nunca temos
de fato um Estado forte o bastante para regular as oportunidades para todos, exatamente
porque o Estado tal como ainda existe é um processo permanente de disputa, mas
não posso jamais defender a tese de que o Estado deve deixar de existir como
pleno e responsável regulador das relações sociais e econômicas das sociedades
modernas.
O Estado não deve ser
como o que defendeu Giovanni Gentile, em que as pessoas devem existir plenamente
em função do próprio Estado organizado e controlado por poucos, porque isso tal
como funcionou sob os governos de Benito Mussolini e Adolfo Hitler já foi o
bastante para provar que não funciona. O Estado deve ser forte para existir em
função dos cidadãos e não de pequenos grupos exclusivos da sociedade. Mas o fim
do Estado como defendem economistas neoliberais, provavelmente em pouco tempo
teremos também uma sociedade em conflitos tão perigosos para a existência da
própria, que superarão em muito as grandes carnificinas promovidas pela
civilização humana até hoje, porque dados os avanços científicos, tecnológicos
e de conhecimento propriamente dito, não se deve acreditar que parcela da
humanidade vai simplesmente ficar tácita diante dos descalabros sociais.
A defesa de que o
capitalismo precisa ultrapassar suas barreiras iniciais para a fase mais
profunda do neoliberalismo, como defende pessoas como os irmãos Koch, por
exemplo, com aparato de seus pesquisadores financiados para tentar de todo modo
implantar tal tese para o resto do mundo, colocará a humanidade diante de seu
grande dilema, a condição de sua própria existência. Avançamos em tudo, mas
estamos retrocedendo aos poucos ao discurso de que parcela da humanidade deve
necessariamente voltar aos tempos piores do que a escravidão. Assimilar o
discurso do Banco Mundial de que parcela da humanidade pode muito bem subsistir
na linha da pobreza com apenas US$ 1,90 por dia, é naturalmente assimilar que
parcela da humanidade também pode está disposta a destruir a própria humanidade.
Nesses tempos, é preciso que a parcela da sociedade dissonante dessas "preciosas"
teses de poucos que se acham iluminados, comecem a repensar em função do perigo
que elas representam para o próprio futuro da humanidade.
No Brasil
escancaradamente em poucos meses de governo de Michel Temer não foi feito outra
coisa até então que não fosse colocar em prática a agenda perigosa de diminuição
do tamanho do Estado, no sentido de privatizar todos os serviços essenciais
desenvolvidos pelo mesmo, como se todas as pessoas tivessem as mesmas
oportunidades, principalmente no tocante à educação, que não ensina nosso povo a
ser empreendedor, mas a ser empregado no sentido mais literal da palavra.
Basta ver o que foi
feito até agora, com congelamento de gastos públicos na área social, reforma
trabalhista que retiram direitos dos trabalhadores, terceirização exagerada de
serviços essenciais, ensino público em que os estudantes não aprendem mais a
pensar (mas a repetir o status quo de uma educação que parece que quem deve dá
não é o próprio Estado, mas a Rede Globo de Televisão), briga encarniçada para
privatizar os serviços de previdência social, além de outras coisas mais que
deliberadamente consistem em eliminar a existência do Estado como regulador do
processo de organização social e econômica no Brasil.
Não é simplesmente
ser voz dissonante das elites nacionais e estrangeiras defender o
fortalecimento do Estado, pois trata-se de pensar que no processo de evolução de
nossas sociedades a existência do Estado é a própria prerrogativa da existência
da harmonia entre os povos, suas culturas e seus costumes. Ser contra que o Estado
seja o responsável pela prestação de serviços essenciais para determinada
população, com recursos e riquezas dessa própria população, principalmente em
áreas essenciais como educação, saúde, assistência social e segurança pública,
é ser simplesmente contra a si mesmo como indivíduo que deve necessariamente
viver em sociedade humana. O mundo não é formado de ilhas particulares, mas
formado de todos que necessariamente vivem em função de todos. Assim, e somente assim, perpetuaremos a raça humana!
Muitos
defendem a tese do fim do Estado por causa da corrupção, mas não quer
saber de que a corrupção não é coisa do Estado, mas dos indivíduos que
são escolhidos para administrar o mesmo, principalmente sob a guarda
quase "espiritual", de nada mais nada menos, do que partícipes do
mercado. Como comprova estatisticamente as últimas investigações,
principalmente no Brasil, quem corrompe, é quem quer o dinheiro que em
tese deveria ser do povo, coordenado pelo Estado, para si próprio. As
mazelas da sociedade moderna não é do monstro nietzschiano chamado
Estado, mas de quem acha que o mesmo deve, ou existir em função de
poucos ou acabar, como pensam os economistas neoliberais modernos.
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