Pular para o conteúdo principal

2012: a crise americana cinco anos depois

A política de Obama de combate à crise foi fundamentalmente uma política de resgate dos grandes, isto é, dos grandes bancos, das grandes indústrias e dos ricos. Foi uma saída que salvou os mais aquinhoados. Mas, que deixou a economia congelada, sem oxigênio no seu mercado de consumo.

Os Estados Unidos sofreram uma grave crise financeira, econômica e social em 2007-2008. Seus efeitos se arrastam até os dias de hoje. As bases teóricas e ideológicas da crise têm suas raízes nas ideias do liberalismo econômico de Milton Friedman, Frederic Hayek e Adam Smith. Sua operação política em escala mundial teve início com os governos de M.Tatcher, no Reino Unido, e R. Reagan, nos Estados Unidos, ao longo dos anos 1980. Este movimento político, econômico e financeiro ficou conhecido como neoliberalismo. Foi transformado em plataforma de ação através do chamado Consenso de Washington, de 1989, que defendia a privatização do patrimônio público e a desregulamentação do mercado financeiro e de trabalho.

Os Estados Unidos desregulamentaram o seu mercado financeiro permitindo que seus bancos participassem de processos de fusão em grande escala. Seus bancos passaram a atuar em escala nacional e internacional e, simultaneamente, em mercados que transacionavam diferentes produtos financeiros. Regras que restringiam o grau de exposição dos bancos a riscos foram relaxadas. O resultado foi que: aos bancos foi permitido maior grau de liberdade, maior exposição ao risco, com o objetivo de obter lucros extraordinários; aos correntistas e poupadores, restou a ilusão de estarem mais seguros porque seus depósitos estavam guardados em mega-instituições financeiras.

Mas, como a crise eclodiu nos Estados Unidos em 2007-2008? A matriz de grandes bancos estão nos Estados Unidos. Lá estavam o Lehman Brothers, o Goldman Sachs e o Bank of America, entre outros. Lá estavam também cidadãos que não tinham e não têm proteção social; e que não tinham e não têm, obviamente, uma política pública habitacional. Gente que tem emprego temporário, renda variável e que não tem qualquer patrimônio. Não usam balaclavas pretas, mas são chamados de NINJAS (No Income, No Job or AssetS - sem renda, sem emprego ou patrimônio). O cenário americano estava montado. Só faltava colocar os personagens em ação.

As taxas de juros nos Estados Unidos estavam muito baixas.

Bancos “babavam” por rendimentos mais elevados. O sistema financeiro desregulado e sem fiscalização inventou, então, novos produtos financeiros dirigidos aos NINJAS, que foram convidados: “venham aos bancos, tomem empréstimos e comprem as casas dos seus sonhos”. Os NINJAS eram considerados cidadãos subprime pelos critérios de classificação dos bancos. Não eram cidadãos PRIME (de primeira) que poderiam pagar empréstimos. Mas, novos produtos financeiros foram ofertados aos NINJAS, que apesar da condição subprime, tomaram bilhões de dólares em empréstimos.

Por exemplo, os bancos passaram a emprestar aos NINJAS, agora com acesso ao sistema financeiro, recursos com carência de juros elevados por cinco anos. Deles eram cobrados juros mais elevados porque representavam mais riscos. Juros mais altos satisfaziam a ganância do sistema financeiro. E com crédito abundante, o resultado foi que o preço dos imóveis inflou como uma bolha, o que satisfazia o desejo das construtoras. Contudo, os cidadãos NINJA-SUBPRIME, nos primeiros anos, pagavam somente parte desses altos juros na presunção que, depois de estarem morando em casa nova, com sonho realizado, suas vidas melhorariam e conseguiriam pagar parcelas mensais mais elevadas (isto é, depois de finalizada a carência de juros mais baixos).

Passados os anos de carência de arrocho financeiro, cidadãos subprime, que tomaram diferenciados tipos de empréstimos imobiliários, não conseguiram pagar suas dívidas. Ao não pagar o que deviam, tiveram que entregar ao sistema financeiro as suas casas e os seus sonhos.

Novamente, voltaram à condição exclusiva de NINJAS. Eram milhões de cidadãos NINJAS-subprime, portanto, eram milhões de casas devolvidas ao sistema financeiro e colocadas à venda. Os bancos, sem receber o que lhes era devido, também não conseguiam vender milhões de casas aos preços originais. O excesso de oferta de casas fez o preço dos imóveis cair. Em resumo, a bolha imobiliária e financeira americana havia estourado.

Bancos americanos perderam a condição de emprestar e de honrar os seus compromissos. Sem bancos operando, as economias param. Sem crédito para o consumo e para a produção, a economia americana estagnou. Sem consumo, não há necessidade de produção. Sem produção, não há necessidade de trabalhadores. O desemprego aumentou. A miséria cresceu. A economia americana adormeceu.

Neoliberais lembraram: “o Estado existe, ele pode nos socorrer”. E, então, o governo americano socorreu seus grandes bancos e suas grandes empresas. Excetuando no Lehman Brothers, choveu dinheiro público na tesouraria das grandes corporações e no bolso dos seus ricos dirigentes. Os bancos e seus dirigentes foram salvos. Tem-se a partir, de então, uma orientação, “mais qualificada”, do neoliberalismo: o patrimônio público deve ser privatizado e as dívidas privadas do sistema financeiro devem ser estatizadas.

E o povo? Aqueles que perderam suas casas, seus empregos, seus sonhos? Viraram estatísticas. As políticas de Barak Obama foram limitadas. O presidente americano está cercado de assessores, escolhidos por ele mesmo, que pensam com cérebros formatados em Wall Street. As políticas anti-crise de Obama apenas incluíram a classe média e os pobres nas estatísticas de mais desemprego, pobreza, desigualdade e miséria.

A política de Obama de combate à crise foi fundamentalmente uma política de resgate dos grandes, isto é, dos grandes bancos, das grandes indústrias e dos ricos. Foi uma saída que salvou os mais aquinhoados. Mas, que deixou a economia congelada, sem oxigênio no seu mercado de consumo. As massas de cidadãos consumidores, que fazem uma economia se movimentar, ficaram endividados, desempregados e sem teto. E o sistema financeiro? Continua, basicamente, desregulado e saudável.

Desde então, a economia americana se arrasta. A grande e boa novidade desde a crise de 2007-2008 é o movimento de contestação OCCUPY WALL STREET.

(*) Professor-Doutor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

LITERATURA

 

A cada dia aumenta o número de pré-candidatos em Feira de Santana, agora é Dilton Coutinho

Por Genaldo de Melo Mais um nome entra na fogueira das discussões e cogitações para ser candidato ao Paço Municipal em Feira de Santana, e o assunto não deixa de ser cogitado hoje em rodas de conversas, jornais, sites e blogs, além do mundo política da cidade. Dessa vez surge como candidato o radialista Dilton Coutinho, nome bastante conhecido nos meios de comunicação local. Ontem em entrevista no seu programa Acorda Cidade na rádio Sociedade de Feira FM o deputado federal Fernando Torres (PSD) disse ser pré-candidato a prefeito, mas caso Dilton resolva ser do mesmo modo, ele oferece seu partido para abrigar o comunicador como candidato: “Eu sou pré-candidato a prefeito de Feira de Santana, mas se você for Dilton Coutinho eu abro mão. O PSD está a sua disposição amigo Dilton Coutinho”, disse Fernando Torres, presidente do PSD no município. Do mesmo modo a discussão apareceu ontem na Câmara de Vereadores pela vereadora Eremita Mota (PDT e pelo vereador David Neto (PTN).

A verdade sobre o esvaziamento das palavras golpe e "Fora Temer"

Por Genaldo de Melo Com a falta de povo nas ruas a mídia trabalha constantemente o esvaziamento do sentido real da palavra "golpe" que está acontecendo de fato.  A palavra "golpe" repete-se, repete-se, e repete-se como um mantra que perdeu o significado.  Num momento tão crucial como este, em que o projeto de governo eleito pelo voto democrático está sendo trocado por outro completamente diferente e que não passou pelo crivo das urnas, substituíram as grandes mobilizações de massa pela ação individual alegórica, pois se pulverizou a indignação popular apenas na palavra “golpe” nas redes sociais e em cartazes.  É impossível não notar que isso ocorre ao mesmo tempo em que a tradicional mídia jornalística trocou a aguerrida cobertura dos acontecimentos econômicos e políticos por um atual tom de meras trivialidades.  Quem acompanha o noticiário político e econômico não deixou de perceber que a mesma indignação que impulsiona inúmeras matérias jornalísti...