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As crises com partidos da base aliada e a reforma política

Por Elói Pietá
As recentes dificuldades nas relações de partidos da base aliada e o governo, mais explícitas nos casos do PR, PDT e PMDB, tem muito a ver com o nosso sistema partidário, com o modo como se elegem os parlamentares, e com o tipo de financiamento da política. O estilo de Dilma provoca muitos descontentamentos, mas a essência do problema não está nele. Tem tudo a ver com o debate trazido pela reforma política, que mais uma vez não foi votada na Comissão Especial da Câmara nesta quarta-feira.

Primeira consideração: há falta de coincidência entre as grandes opções da política e a multiplicidade de organizações partidárias. Temos 29 partidos no Brasil e as reais correntes de pensamento político se resumem a cinco: duas correntes são bem minoritárias, a extrema esquerda e a extrema direita; duas outras nos tempos recentes tem exercido o poder e disputam programas distintos para o país, a centro-esquerda (distributivista no plano econômico-social e aberta quanto aos costumes na sociedade) e a centro-direita (elitista no plano econômico-social e conservadora nos costumes); e um numeroso centro pragmático, que em algumas questões pende para um lado, em outras para o lado diferente.

Segunda consideração: é de lideranças locais que basicamente se forma o Congresso Nacional. Até mesmo quando representam segmentos, são alçados a Brasília porque convivem com políticos e comunidades da região, em eventos locais, em relações de amizade, buscam solucionar assuntos específicos.

A presidência da República é eleita sob outros critérios: o programa de governo para o país, a imagem do partido ou frente partidária que lhe dá sustentação, a coerência da candidatura presidencial com as expectativas populares daí decorrentes. Ao nomear o ministério e os inúmeros cargos dirigentes do governo com os partidos da base parlamentar, a política nacional termina tendo que fazer a composição com a soma de lideranças locais e de um grande número de partidos artificiais. Hoje são 17 legendas governistas, número multiplicado pela formação de grupos divergentes dentro dos partidos.

Terceira consideração: muitos problemas atuais são conseqüência da forma como são financiadas as campanhas eleitorais. Não há financiamento sem interesse. A busca de resultados junto ao poder público é o principal móvel dos financiadores. E, atendê-los, por gratidão e para tê-los ao seu lado em futuras campanhas, é a tentação dos financiados quando vão para o governo.

Esta hora de tensão nas relações parlamentares e governo nos remete de novo à necessidade de uma reforma política. A resistência a ela é de quem não quer mudar esse jeito de fazer política que privilegia interesses de pessoas e de grupos, boa parte herdeiros históricos de famílias que há décadas se instalaram no sistema político.

Esta reforma, embora haja boas propostas para ela na Comissão Especial da Câmara dos Deputados, não se viabilizou até aqui porque ficou dependendo apenas do Congresso e dos partidos.

Faltou mobilização e consensos na sociedade, acordo entre os partidos que tem conteúdo mais definido no espectro das opções políticas, e presença do governo federal, uma das vítimas deste sistema. A grande mídia privada, que tanto peso teve na queda de ministros e em mudanças como a aprovação da lei da ficha limpa, parece preferir que prossiga este espetáculo, que lhe premia com prestígio e força social quando ataca a política. A reforma política ajudará o país se for no sentido de fortalecer os compromissos dos partidos na sociedade, de atenuar a maneira paroquial como se elegem os parlamentares, de mudar o financiamento da política.

A recente tensão na base aliada foi a oportunidade para a presidenta reafirmar o rigor na defesa do interesse público, padrão necessário de quem vai para o governo, e para o qual a presidência dá o exemplo. Ela pode ser aproveitada para um pacto público em torno de pontos concretos de um programa de ação do governo para estes três anos. Será uma contracorrente a esta dispersão provocada pelo nosso sistema político. Mas, enquanto ele está aí, é com ele que convivemos. Tudo indica que teremos ainda um longo período de tapas e beijos. Na política tem beijos que precisam ser dados quando não ferem as boas normas republicanas, como receber os parlamentares, falar com eles, liberar suas emendas de interesse regional. Ao menos, atenuam os tapas.

*Elói Pietá é Secretário Geral Nacional do PT.

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